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INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO

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INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SÓCIO


Decisão do STJ no Resp 1.104.900/ES, que inverte o ônus da prova no tocante a responsabilidade tributária do sócio a nosso ver afronta os princípios do contraditório e da ampla defesa, consagrados em nossa Constituição Federal.

José Lacerda Machado Júnior * 

Em recente e preocupante julgamento do Resp n° 1.104.900/ES, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que cabe ao sócio que consta na Certidão da Dívida Ativa – CDA o ônus de provar a inexistência de sua responsabilidade tributária, e que não contribuiu para quaisquer das hipóteses elencadas no art. 135 do Código Tributário Nacional. Ou seja, cabe ao sócio provar que não agiu com excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatutos.

Essa decisão uniformizou decisões divergentes de duas Turmas de Direito Público do STJ quanto ao ônus da prova.

Todos que militam na área tributária sabem que é rotina administrativa da Fazenda Pública fazer constar na CDA, além da sociedade, os sócios desta.

Ocorre que não há que se falar em presunção de responsabilidade tributária para os sócios.  A presunção de certeza e liquidez  da CDA, prevista no art. 204 do Código Tributário Nacional, decorre, sim, de um processo tributário administrativo – PTA, instância na qual é assegurado ao sujeito passivo o contraditório e a ampla defesa.

Dar aos sócios o direito ao contraditório e à ampla defesa no processo tributário administrativo - PTA, como em qualquer outro processo,  não se trata de uma  benesse do Estado aos seus governados, mas uma questão de ordem pública, sendo essencial a qualquer país que pretenda ser, minimamente, democrático. Esses princípios estão consagrados em nossa Carta Magna, mais especificamente, no art. 5°, inciso LV, podendo ser definido também pela expressão “audiatur et altera pars”, que significa “ouça-se também a outra parte”.

Não desmerecendo a competência e o preparo dos membros do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, o alcance do mencionado julgado é preocupante e, no mínimo, temerário. Isso porque nas hipóteses em que o sócio não tenha figurado no polo passivo do processo tributário administrativo – PTA (o que geralmente ocorre), não teve a oportunidade de defender-se sobre os fatos a ele imputados pela Fazenda, surgindo daí uma CDA, com presunção de liquidez e certeza.

Pelo que consta da referida decisão, caberia aos sócios provar que não violaram a lei ou contrato social ou que não agiram com excesso de poderes. Em outras palavras,  deverá ter o ônus de provar tais inocorrências, tornando a sua defesa praticamente impossível.Teria de provar fato negativo. É a chamada “probatio diabólica” ou seja, a prova impossível ou de difícil realização para uma das partes no processo.

Melhor seria ter o Superior Tribunal de Justiça  adotado a flexibilização da prova. Como nos ensina KFOURI NETO, MIGUEL, em sua obra Culpa médica e Ônus da Prova, 4ª edição, São Paulo, RT, 2002, p. 137, “… é possível que apenas uma das partes tenha a aptidão ou condições de produzir determinada prova, quando então a ela deverá ser direcionado o ônus probatório, como forma de garantir a isonomia substancial no processo.…a teoria dinâmica tem como vantagem a flexibilização do sistema, permitindo ao juiz que, diante da insuficiência da regra geral, possa modificar o ônus da prova, destinando-o à parte que tenha condições de produzi-la. O legislador, por mais que tente, jamais poderá prever todas as situações da vida real. Ao criar uma regra apriorística a respeito do ônus probatório o legislador não poderia atingir ou regulamentar todos os casos concretos que poderiam ser levados à apreciação do Estado-Juiz, fato impossível diante da multiplicidade dos conflitos intersubjetivos existentes, como decorrência das multifacetadas relações de direito material. Enfim, "o sistema deixa de ser pétreo, para se tornar dinâmico.”

Portanto, concluindo, entendemos que não andou bem a decisão em questão ao inverter para o sócio o ônus da prova quanto a sua responsabilidade tributária, pois esse é incluído na maioria das vezes,  automaticamente, na CDA sem o devido processo legal.

A CDA jamais poderia incluir  sócios, sem que esses tivessem a oportunidade de se defender no Processo Tributário Administrativo – PTA, foro esse, sim, adequado para as partes  praticarem todas as imputações e defesas, prestigiando e assegurando, destarte, os princípios do contraditório e da ampla defesa, consagrados em nossa Carta Magna.

* advogado e sócio de J.Lacerda Advogados


Publicado em 05/07/2009 23:05:49.